sábado, 30 de maio de 2009

Você produz ou reproduz?


No que você pensa quando esta frase lhe vem em mente de forma súbita? Um tapa na cara? É verdade, pra muitos vai soar como um (ou não). A mesma frase que introduz a mais recente música da minha banda: "A imagem, seu reflexo" (que também remete outros contextos). Frase esta provém de uma reflexão minha diante de textos/discursos/letras que li, fazendo portanto uma "mesclagem" dos mesmos incluindo o texto "Visibilidade e espetáculo" de Maria Rita Kehl (Psicanalista); e um dos capítulos do livro "Criatividade - Psicologia, educação e conhecimento do novo", "Cap.4 - Criatividade no mundo contemporâneo" do sociólogo José Sterza Justo; discursos do Rodrigo Ponce (ex letrista/vocalista da banda colligere/filósofo), e letras do próprio colligere.
Sem me delongar mais, vamos ao foco: produção e reprodução no contexto da sociedade contemporânea. E você, que está lendo este texto agora, produz ou reproduz? É até estranho pensar nisso, porque se formos pensar de forma instântanea, não conseguimos remeter isso a nada no âmbito da nossa vivência, das nossas percepções e escolhas. Mas isso ficou um pouco mais claro pra mim após ouvir (e depois repassar para o computador) um discurso do ex vocalista/letrista do colligere, Rodrigo Ponce, eis o discurso:

"Hardcore sempre é uma coisa sobre reafirmar sua identidade, sobre fazer você mesmo, sobre ser você mesmo, sobre não se alienar. Mas sempre na maior parte dos momentos da sua vida, do seu cotidiano, você está alienado, você não é você mesmo. Você reproduz discursos, você reproduz estímulos, você reproduz comportamentos, no trabalho, e não tem como ser de outro jeito, vai ser sempre assim. O que que é ser você mesmo, então, no meio desse mundo onde a gente está apenas reproduzindo cultura? Talvez seja.. se apropriar daquilo que se reproduz de uma forma original, é como aquilo que todo mundo disse pra você mesmo, então aquilo vai ser seu, enquanto isso, você é só uma cópia.''

Rodrigo Ponce

Portanto, levando isso pra uma reflexão pessoal, eu poderia dizer que a questão de produzir ou reproduzir é um tanto polêmica, porque hoje em dia todo mundo reproduz, até os conscientes. A mídia produz mensagens as quais são absorvidas pelas pessoas como única verdade (reprodução em massa), e estas, por acreditar cegamente nela, passam a agir conforme seus padrões, e então funcionamos como verdadeiros robôs padronizados (e este é apenas um dos diversos contextos em que reproduzimos; talvez o mais importante dentro do contexto da nossa atual sociedade).
Mesmo as pessoas conscientes reproduzem (menos que as não conscientes) pois vivemos numa sociedade baseada nisso, a dita ''sociedade do espetaculo'', porém os conscientes, cientes de que as mensagens manipulam, reproduzem de uma forma original, se apropriando daquilo que os é habitual de uma forma original. O que seria então se apropriar daquilo que nos é habitual de
uma forma original? Todos nós reproduzimos certo? Correto! Então: podemos nos apropriar de uma reprodução (seja ela em qual contexto for - estímulos, comportamentos, no trabalho, meios midiáticos, nos estudos, etc) de uma forma original, ou seja, sabendo que a informação chegará até nós de determinada forma, devemos crer nela sob nossos moldes, sob nossa consciência, sob nossa verdade, e assim prezar por nossa crítica perante a forma como tudo isso foi moldado. E assim não seremos uma cópia que reproduz de forma contínua, e sim estaremos reproduzindo de uma forma original, o que se aproxima de uma "produção", apesar de utópica.

Eis mais um verso, este do sociólogo José Sterza Justo:

"Nunca foi tão importante criar ("produzir"), seja para acompanhar a onda da modernidade ou para confrontar-se criticamente com ela"

José Sterza Justo - "Criatividade - Psicologia, educação e conhecimento do novo" pág. 63

O importante é sempre manter a auto-crítica, e a crítica perante tudo que nos cerca, que nos molda, que quer nos esmagar, nos engolir! Se não, iremos apenas respirar e ver tudo passar, e quando percebermos, seremos apenas robôs padronizados, não guiados por nossas próprias pernas. Nós somos senhores do nosso próprio destino, quem vai mudar nossa sina, se não nós
mesmos?

Para concluir, me apoiarei sob versos que o próprio Rodrigo Ponce escreveu, versos de uma letra do colligere intitulada "Falso".

''Trago aqui as idéias que me formaram,
mas esta forma também pode criar novas escolhas

Lendo os fatos, produzo conseqüências
Posso criar uma nova leitura
E o verbo então se fará carne ou toda pele será como espelho?
E a paixão de um novo modo pode brilhar sobre essas palavras gastas?''


Rodrigo Ponce

No mais, quem quiser dar uma olhada na minha letra "A imagem, seu reflexo", cuja frase de introdução é justamente a que nomeia este texto, aí vai o link: http://letras.terra.com.br/faina/1405955/

5 comentários:

  1. "O que que é ser você mesmo, então, no meio desse mundo onde a gente está apenas reproduzindo cultura?"

    O verdadeiro significado da palavra "cultura" já diz por se só, o seu verdadeiro intuito. Cultura quer disser proliferar algo, manter sob alguma matriz...
    Esse texto me levou à um pensamento bem conhecido pelo mundo, o de "perpetuar a espécie". Parece que as pessoas levaram isso bem ao pé da letra,pq realmente as pessoas estão cada vez mais estáticas, mais parecidas com robôs, seguindo o molde de sua matriz, assim mantendo a cultura.
    De maneiras diferentes,mas no fundo, somos todos iguais (se é que é intendivél minha concepção). A incessante luta das pessoas dotadas de criticidade, em se tornar diferentes, os tornam iguais no tocante de serem realmente diferentes.

    Segundo a filosofia, é só isso que seres conformados fazerm, REPRODUZIR!
    A diferença entre os filosofos é de pensar em algo que ninguém nunca pessou antes, e a pertir dai, voltar a produzir.
    Acredito que venha disso o pensamento do Rodrigo, já que citaste que ele é filósofo.


    O texto me fez pensar em muita coisa... até naquilo que faz parte da minha personalidade, já que alguns me julgam de crítica e desapegada à futilidades. Mas verdade é uma só, podemos até tentar ser diferentes, mas no fundo aquilo que julgamos de hipocrisia sempre vai nos vencer. Somos produtos de um meio "alienado" e por mais que tentemos não ser, não há pra onde correr,e só me faz pensar que cada vez mais, sou um produto do sistema, porém, pensante, mas ainda sim, um produto.
    E é assim que sempre será, reproduzindo idéias diferentes, mas, sempre à reporduzir.

    Parabéns pelo texto Iaguito, à sua cara:bem reflexivo.

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  2. Fala, Iago!

    As pessoas (nós) reproduzimos/copiamos por pura insegurança, para nos sentirmos parte do todo.

    Mas vamos lá, formemos um consciente contracultural, por que sois senhores do destino!

    Abraço!

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  3. Você pode curtir ser quem você é, do jeito que você for, ou viver infeliz por não ser quem você gostaria.Você pode assumir sua individualidade, ou reprimir seus talentos e fantasias, tentando ser o que os outros gostariam que você fosse.Você pode produzir-se e ir se divertir, brincar, cantar e dançar, ou dizer em tom amargo que já passou da idade ou que essas coisas são fúteis.Você pode olhar com ternura e respeito para si próprio e para as outras pessoas, ou com aquele olhar de censura, que poda, pune, fere e mata, sem nenhuma consideração para com os desejos, limites e dificuldades de cada um, inclusive os seus. Reproduzir-se pode ser o único meio de sentir-se parte de um todo. Talvez seja esse o motivo de que Mesmo as pessoas conscientes reproduzirem. Como meu Iaguito falou: -podemos nos apropriar de uma reprodução de uma forma original, E assim não seremos uma cópia.
    “Aceitação é a chave para a mudança daquilo que, em sua opinião, ainda não está ideal. Ser você mesmo implica em aceitar o que se tem neste momento e começar a partir daí.”

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  4. Produzir ou reproduzir... Sabe, isso me leva a repensar sobre muitos conceitos ameus que a partir e então se tornaram obsoletos...
    Reproduzimos por insegurança, sim, mas por tbm tudo ao nosso redor está ao alcance da tecnologia, não de nossas mãos. Nos tornamos escravos de sistemas, de seres abstratos que soh tem existência em nossas mentes, no nosso desepero, no nosso medo de morrer... Hoje as pessoas pensam menos pq tem algo ou alguém que pense por elas, e nossa criatividade desce ladeira à baixo... Querem nos tornar ortodoxo e na ortodoxia se encontra a inconsciência, o sentimento de que não precisamos pensar.
    Se querem saber o que é o incentivo ao "Reproduzir" leiam "1984", de George Orwell, onde nos vemos num muno em que fatos histórico são apagados como se tivessem sido escritos a lápis e pessoas que são contra a ordem do Grande Irmão são 'vaporizadas'.

    Parabéns pelo excelente texto, Iagão!! É como se você estivesse em cada letra desse texto, é o reflexo de ti.

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  5. Colligere é a tua cara! É isso aí Iaguinho, sensacional... psicanálise e sociologia me matou de orgulho! Muito bem... eu produzo, o que de vez em quando é um porre, porque às vezes eu tenho vontade de futilidade mas não sei diminuir minha marcha...

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